domingo, 2 de dezembro de 2012

III Web Currículo: Educação e Mobilidade (PUC/SP)

Nos dias 12, 13 e 14 de novembro aconteceu o "III Web Currículo: Educação e Mobilidade", na PUC/SP. Foram três dias de muita interação, troca de experiências, relatos de práticas, comunicações de pesquisas e palestras nas várias Mesas redondas sobre o uso de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) na escola. Difícil foi escolher de quais palestras participar.

Compartilho aqui as minhas anotações sobre a Palestra Inaugural, que aconteceu no dia 12 de novembro, com Juan Carlos Tedesco (considerem que são apenas anotações, portanto pode haver quebra de pensamento....mesmo assim, acho que vale a pena conferir!).


Título da Palestra inaugural: Educação, Tecnologia e Justiça Social na Sociedade do Conhecimento.
Palestrante: Prof. Dr. Juan Carlos Tedesco, Director de la sede regional del Instituto Internacional de Planificación de la Educación en Buenos Aires.
Interlocutor: Alípio Dias Casali, PUC/SP
O Palestrante Prof. Dr. Juan Carlos Tedesco inicia dizendo que a história da educação nos últimos anos é a história das reformas. Para que queremos mudar a Educação? Estamos diante de uma opção ético-política. Os sentidos da Educação no século XXI precisam estar pautados na construção de uma sociedade mais justa. É preciso colocar a discussão do uso das tecnologias nesse contexto.
Disse que há, de forma geral, uma sensação de ceticismo nas propostas de mudanças. Foram alcançados níveis de avanço interessantes em alguns aspectos, mas a insatisfação vem em relação aos níveis sociais e origem das famílias, há um determinismo social que a escola não está conseguindo mudar. Hoje temos problemas também em outras classes sociais, no sentido de desenvolver competências. Mudar a Educação é algo muito difícil, é bom aceitarmos isso para não ficarmos iludidos.
O palestrante diz que na Argentina, as mudanças curriculares (reformas) chegam apenas até a porta da sala de aula. Mudaram os currículos nos últimos 20 anos, mas se pegarmos os cadernos de sala de aula, veremos as mesmas coisas. Ou seja, mudar a Educação não é algo simples.
Descentralizar ou não? Dar autonomia ou não? Os procedimentos dependem do âmbito político. A ideia de passado está associada ao que é obsoleto. O futuro está associado à incerteza, crise ambiental, entre outras coisas. Então, uma cultura que rompe com o passado e onde o futuro é incerto, tende a concentrar-se no presente. Cultura à curto prazo. Os educadores ficam em situação de crise, mal estar docente, crise nas escolas.
Ainda há dois extremos: o fundamentalismo e o individualismo (ideia postulada pelo mercado). Diante desses dois extremos, é preciso construir uma proposta que prime por uma sociedade mais justa, viver em comunidade, construir um projeto coletivo.
Hoje, precisamos de uma educação que permita níveis de solidariedade exigidos pela sociedade. Cita Fernando Pessoa “se o coração pensasse, ele pararia”.
O palestrante diz que o excluído não é necessário do ponto de vista produtivo. Nesse sentido, construir sociedades mais justas é o grande desafio do futuro. A Educação é uma condição necessária para a construção da justiça social. Cita alguns estudos da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe), criado pelas Nações Unidas.
Diz que hoje faz-se necessária a alfabetização científica e tecnológica. E salienta que é importante diferenciar o acesso universal ao domínio das novas tecnologias e as questões pedagógicas no uso dessas tecnologias. As questões colocadas são diferentes.
Quem não está inserido no mundo digital, fica fora das informações mais importantes que estão circulando. Há hoje programas de inclusão digital importantes na América Latina, um exemplo é o projeto “Um Computador por Aluno” (UCA).
Diz que toda escola deveria ter uma disciplina chamada Alfabetização digital.
O que significa inclusão digital em termos de alfabetização? É um assunto complexo onde temos que assumir uma postura científica. É preciso que trabalho em equipe, interação, cooperação, façam parte do projeto de uso das tecnologias, à serviço dos Projetos Pedagógicos. É fundamental discutir o Projeto Político pedagógico no qual são utilizadas as TIC´s.
Segue a palestra citando algumas pesquisas que considera importantes na área da neurociência. Diz que as crianças tem tempo de concentração curto, surfam, artificialmente. Há polêmicas, pois há pesquisas que apontam que jogos desenvolvem o pensamento complexo. É preciso estar “a par” dessas pesquisas e suas polêmicas, para que se possa pensar a respeito de decisões importantes politicamente falando.
Citou Nicolas Negroponte e a sua ong OLPC (one laptop per child). Disse que é necessário pensar na comercialização, mas a partir das necessidades sociais. Quais os problemas educacionais que esses laptops estão resolvendo?
É a tecnologia que tem que se adaptar aos problemas da escola e não o contrário.
Nesse momento, Juan Carlos Tedesco finaliza sua fala e em seguida o professor Alípio Casali faz a sua fala destacando iria chamar a atenção para alguns pontos da fala de Tedesco:
   Tedesco inicia falando de ceticismo e termina falando sobre o olhar para o futuro.
* O determinismo social ainda influencia os resultados.
* É preciso manejo adequado para o uso das tecnologias na Educação (investimentos)
*   Formação de sujeitos da ação social: com ética e visando uma sociedade mais justa, menos piramidal e mais plana, onde a Educação torna-se indispensável e as tecnologias entrem como dispositivos pedagógicos adequados para esse projeto.
* É preciso avançar nas pesquisas educacionais, colocando as TIC´s à disposição do Projeot Pedagógico e não o contrário.
Tedesco fala:
É preciso articular cultura digital com cultura científica. Temos muito desenvolvimento tecnológico e pouca cultura científica. É preciso um olhar interdisciplinar para o uso dessas tecnologias, um olhar sistêmico e complexo.
E vocês, o que acham?

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Distribuição de conteúdos e escrita colaborativa (Alejandro Piscitelli)

Contexto: o que apresento abaixo é um resumo do texto "distribuição de conteúdos e escrita colaborativa", escrito por Alejandro Piscitelli. O resumo foi preparado para a disciplina "Tecnologias digitais em espaços educativos", ministrada pela professora Lucilene Cury, que curso na ECA (Escola de Cominicações e Arte) da USP.


Alejandro Gustavo Piscitelli formou-se em Filosofia na Universidade de Buenos Aires e obteve mestrado em Ciência de Sistemas na Universidade de Louisville (EUA) e na Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais  (FLACSO). É consultor organizacional em Internet e e-commerce. Atua como professor de oficina de processamento de Dados, Telemática e Informática, pela UBA. Além disso, ministra cursos de pós-graduação na UBA, FLACSO, Universidad de San Andrés, e varias universidades Argentinas e Latino-americanas e espanholas. Ocupa importante posição como consultor em programas e organizações em sua especialidade. É ainda, co-editor da revista eletrônica Headline News Interlink. (resumo retirado de http://alejandro-piscitelli.webnode.com/  acesso em 02/11/2012)

Distribuição de conteúdos e escrita colaborativa

No livro “Internet, la imprenta del siglo XXI”, de Alejandro Piscitelli, há um capítulo destinado à discussão da distribuição de conteúdos e escrita colaborativa. Neste capítulo, o autor discute a produção e distribuição de conteúdos na Internet, dando destaque aos blogs e as wikis, traz um histórico sobre o desenvolvimento tecnológico desde o telégrafo, passando pela imprensa, o rádio, a  TV e mais recentemente, a Internet. Apresenta uma visão crítica sobre a ideia de armazenamento ilimitado e interação com milhões de pessoas, tendo como pano de fundo a questão da desigualdade econômica posta pelo capitalismo. Reconhece que há democratização e aumento da produção de conteúdos na web, mas ressalta a perda de qualidade do conteúdo produzido como conseqüência do amadorismo massivo das publicações. Ainda assim, destaca a importância da gratuidade da produção na rede, enfatizando o potencial da produção democrática e colaborativa.
Piscitelli chama a atenção para a necessidade de análise das relações existentes entre os novos suportes e linguagens que temos hoje e a história de distribuição dos conteúdos que se vai gerando no processo dessas transformações. Para isso, faz uma rápida imersão pela história, discorrendo sobre as dificuldades de produção e distribuição dos manuscritos, pelo seu altíssimo custo, em seguida destaca a importância do surgimento da imprensa para a Europa e para todo o planeta, mas ressalta ainda o alto custo e por isso, era tarefa para grandes empresas e mais tarde o surgimento do rádio e da TV como novos mecanismos de irradiação de informações, porém, pelo alto custo em obter equipamentos e licenças para manter a distribuição, era ainda tarefa para poucos ricos e poderosos. Com a chegada da Internet, conquista-se o meio de geração e distribuição de conteúdos mais econômico e acessível da história.
O autor destaca que os preços das máquinas caíram significativamente de modo simultâneo à criação da Internet. A criação da Internet é considerada como a maior revolução da história da comunicação. Segundo Piscitelli, “agora qualquer pessoa podia publicar qualquer coisa e qualquer outra podia lê-la, onde o horizonte da publicação parecia abrir-se para o infinito e as barreiras que impediam uma circulação massiva das mensagens uma distribuição altamente global dos conteúdos parecia haver desaparecido como por arte de magia” (pág. 83). Porém, de forma crítica, o autor relativiza essa democratização, pois não é verdade que todos tem acesso às publicações de todos. Não se pode esquecer que a possibilidade de publicação “um para muitos” depende de fatores totalmente externos como, por exemplo, a largura da banda. Da mesma maneira, há um limite nas contas de distribuição, e traz como exemplo situações em que o envio por e-mail de arquivos como apresentações em PowerPoint  não são possíveis de se concretizar quando estes ultrapassam o tamanho em bytes especificado pelo serviço de correio eletrônico. O autor diz que é claro que existem espaços de armazenamento ilimitados, mas são cada vez mais caros, ou seja, há poucas opções intermediárias. Nesse cenário, é impensável imaginar que um usuário comum, de recursos médios, tenha a possibilidade de ser visitado por centenas de milhares de pessoas diariamente. Reconhecer isso é dizer que não há tanta liberdade como se pode parecer.
Apesar da questão econômica, Piscitelli destaca que existem outras variações de produção coletiva na rede que merecem consideração, como os blogs e as wikis. A wiki (que significa rápido), é uma aplicação de informática colaborativa, que permite que documentos web sejam criados coletivamente sem que exista uma instância hierárquica de aprovação antes que seja publicado e isso de forma simples e fácil, dá como exemplo a wikipédia. Essa mesma facilidade de uso ocorre com os blogs (ou weblogs), onde as pessoas são conteúdistas, editores, assistentes técnicos, designers e etc.
O que ocorre, por outro lado, com os blogs e wikis é a diminuição do valor econômico das publicações e a perda de qualidade do conteúdo, que decorre do amadorismo massivo das publicações.  “Sem dúvida, os artigos não são os mesmos que podemos encontrar na Enciclopédia Britânica, porém, não custam um centavo baixá-los na rede e o importante não está somente no valor dos seus artigos, mas na magia que há em que a wiki-comunopédia funcione, some talentos e qualidade, e sobretudo cresça, se difunda e seja ambiciosa e efetiva” (pág.88).

Nas palavras de Piscitelli:
“Num mundo hierárquico, onde quase tudo está organizado não tanto pelos que sabem, mas pelos que podem e querem; onde a brecha entre o saber e o fazer multiplica-se diariamente, gerando dificuldades e frustrações a granel, o exemplo das wikis como a wikipédia, mostra que há outra forma de fazer as coisas e que, por sorte, podemos participar dessas construções complementares” (pág. 88-89)

Para finalizar seu texto, Piscitelli diz:
 “A conclusão previsível de tudo isso é que o maior erro que se pode haver é imaginar cobrar pelo que deve ser gratuito, ainda que curiosamente essa seja a base da mercantilização e o motor oculto do capitalismo.  Blogar é hoje um hobby e um presente divino por obra e graça da santa tecnologia, não são o paraíso dos milhões, mas sim uma fonte inesgotável de mesas virtuais e pequenos grupos que seriam impossíveis de fomentar, manter ou gerar no mundo real. Nesse sentido, a massificação que a Internet gera é algo que tem um valor incalculável. Porque o mais interessante e reconfortante dos blogs é que geram conversas que são importante para nós, conversas em que ser parte do jogo é uma recompensa que nenhuma moeda poderia substituir jamais” (pág. 91)

Assim, Piscitelli nos faz pensar sobre as complexas relações existentes entre o surgimento da Internet e as inúmeras possibilidades que ela nos traz em sua versão 2.0, não nos deixando esquecer da relevância em pensar no seu contexto de surgimento, a globalização e o capitalismo e as implicações deste contexto nesse novo universo da produção e distribuição de conteúdos. Sendo assim, ainda estamos num processo de construção de um “mundo sem fronteiras”, onde a questão central deve ser a busca pelo acesso democrático e irrestrito a tudo o que essas ferramentas digitais e colaborativas põem nos oferecer.

Bibliografia
PISCITELLI, A. Distribuición de contenidos y escritura colaborativa. In: Internet, la imprenta del siglo XXI. Barcelona: Editorial Gedsa, 2005.

Para saber mais sobre Alejandro Piscitelli, acessem o blog colaborativo que a turma da disciplina da ECA citada acima produziu:  http://alejandro-piscitelli.webnode.com/

 

domingo, 21 de outubro de 2012

Ada, ada, ada, vem aí a Ernanada!!!

A frase acima “vem aí a Ernadada” foi lida por todos os/as alunos/as da EMEF Ernani Silva Bruno (escola onde sou coordenadora pedagógica), em um banner afixado no pátio da escola dias antes da semana da criança. Para quem não sabe, a “Ernanada” é o nome carinhoso (que vem de Ernani, nome da escola) para uma “competição saudável” que acontece na escola durante a semana da criança. Mas por trás da competição, há vários outros objetivos, todos relacionados ao Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola.

O primeiro deles tem a ver com a convivência, protagonismo e trabalho cooperativo entre professores e alunos. Durante uma semana, crianças de 06 a 10 anos (primeiro ao quarto ano do ciclo I) e adolescentes de 11 a 14 anos (quinto ao oitavo ano do ciclo II) trabalham juntas/os em suas equipes. Há toda uma preparação para que isso ocorra. Antes, é necessário distribuir as crianças e adolescentes nas 06 equipes (6 no ciclo I e 6 no ciclo II). Por exemplo, se a professora tem uma classe de primeira série, ela precisa dividir o número de crianças em 6 grupos diferentes. Com todas e todos fazendo isso, têm-se grupos multi-idades. Quando todos os grupos estão formados, todos os dias eles se reúnem para desenvolver diversas atividades relacionadas às competições.

A Ernanada tem um tema específico. Esse ano o tema foi o “centenário de Luiz Gonzaga e cultura nordestina”. Cada equipe tem uma cor e um tema. A cor é sorteada e o tema também. Por exemplo, no ciclo I tínhamos as equipes verde, vermelha, amarela, azul, laranja e marrom. Cada equipe desenvolveu um tema específico dentro do tema geral: comida típica nordestina, cordel, causos, festas populares, música, entre outros. Então funciona assim: cada equipe precisa pesquisar sobre o assunto sorteado e preparar uma apresentação do tema para todas as outras equipes. Além disso, cada equipe precisa criar um grito de guerra e uma bandeira.

Além dessas atividades, as equipes precisam se preparar para as outras provas:
  • Quem sabe, sabe (aonde os alunos irão responder à questões relacionadas ao tema do evento, no caso, o centenário de Luíz Gonzaga)
  • Quem sabe, canta (nós colocamos uma música nordestina e, quando a música parar, a equipe tem que continuar cantando)
  • Cante você (cada equipe devia preparar a apresentação de um repente)
  • Caça-tranqueira (cada equipe precisa unir durante a semana objetos que tem a ver com o tema, pois serão pedidos no dia da competição. Ex. Chapéu de nordestino, fuxico, etc.)
  • Dançar forró (cada equipe escolhe um casal para dançar forró e representá-la)
  • Dançar frevo (cada equipe escolhe um casal para dançar frevo e representá-la)
  • Vestir-se tipicamente para desfilar em um dos dias (esse dia é avisado com antecedência)

No ano anterior, o tema foi “escritores/as”: cada equipe estudava a biografia e obra de um/uma escritor/a e tinha que apresentar e as provas variavam bastante: tivemos concurso da melhor foto feita com o laptop educacional do projeto UCA (Um computador por aluno), entre outras. As provas também podem variar entre ciclo I e ciclo II, por exemplo: os dois ciclos tinham a prova “quem sabe, sabe...”, mas as perguntas eram diferentes.

As competições acontecem durante três dias seguidos e, no último dia, há festa de encerramento com música típica, cachorro quente e bolo para o dia das crianças. É quase que uma “missão impossível” descrever o envolvimento dos professores e dos alunos. As atividades acontecem na quadra coberta da escola, e parece um arco-íris, já que as equipes também pontuam pelo número de pessoas vestidas pela cor da equipe. Pom-pons coloridos também são bem-vindos. Há uma equipe julgadora composta por funcionários da escola e um “animador/a” que geralmente é o diretor e as coordenadoras pedagógicas.

As equipes vencedoras de 2012, uma do ciclo I e outra do ciclo II ganharam como prêmio um dia em uma chácara, com piscina, almoço e diversas atividades recreativas.

A semana que antecede à Ernanada, é sempre muito corrida e exige um trabalho coletivo imenso: professores e funcionários se ajudam para que dê tudo certo. Para as crianças e jovens é um aprendizado enorme: eles pesquisam, vão atrás de materiais diversos, precisam decidir coletivamente como apresentarão o seu tema, precisam criar o grito de guerra, criar a bandeira, estudar, preparar a apresentação, e isso tudo em grupo: ou seja, precisam dividir as tarefas, ajudarem-se, delegar atividades, considerar o que cada um tem mais facilidade, lidar com a diferença de idade...olha quanto aprendizado! E as professoras e os professores precisam trabalhar em grupos também...descobrem novas parcerias e se envolvem tanto...que as vezes é preciso acalmar os ânimos...rsrs

Mas no fim, todos/as ganham e as crianças e adolescentes se divertem a aprendem muito! Afinal, quem foi que disse eles/as só aprendem dentro da sala de aula, com a mesma idade, todos fazendo a mesma coisa ao mesmo tempo?

Agora todos/as sabem quem foi Luiz Gonzaga, o que ele representa, onde nasceu, entre outras coisas...cultura na escola!

E você, o que achou?

Por Edna Telles

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Escola para a diversidade: faz sentido para você?



A escola face ao contemporâneo é a escola da diversidade. Pelo menos é isso que qualquer discurso educacional que se pretenda sério explicita. Ouve-se falar em diversidade na escola em discussões sobre projetos políticos pedagógicos, nas orientações gerais das expectativas de aprendizagem, nas partes teóricas acopladas aos livros didáticos (que vamos e venhamos, quase ninguém as lê), nos congressos educacionais, nas reuniões em diretorias de ensino, no senso comum em geral. Mas, o que é a diversidade? O que é trabalhar com a diversidade? Sabemos lidar com a diversidade?
Em primeiro lugar, a “diversidade” são os outros. São aqueles e aquelas que não se encaixam nos modelos considerados “normais”. Geralmente esses modelos são construídos pautados em relações de poder, numa visão elitista e androcêntrica do mundo (indivíduo do sexo masculino como centro de todas as coisas). A diversidade são os/as negros/as, os índios/as, os/as pobres, as mulheres, os/as homossexuais, os/as assexuais, os/as idosos/as, e pasmem! Também muitas vezes, as crianças. E lidar com a diversidade é lidar, em primeiro lugar, com nossos próprios preconceitos.
Falar de diversidade na escola pública é falar de um compromisso com o público, com o diverso e, portanto, não com valores próprios, mas com valores comuns. A escola pública é para todas e todos. É por meio da educação escolar que deve-se construir uma cultura cidadã, onde todos/as se respeitem e tenham as mesmas oportunidades e condições de trabalho e de aprendizagem. Não é tarefa fácil, ainda mais nos dias de hoje que, para além das questões da diversidade, ainda temos que pensar nas questões do acesso às tecnologias digitais e ao mundo que elas são acesso.
Os desafios da profissão docente hoje são imensos. Um/uma professor/a precisa aprender a lidar com a tecnologia e, ao mesmo tempo, superar seus próprios preconceitos e trabalhar para a diversidade.
Uma auto-avaliação deve ser feita por todas e todos que estão nas salas de aula: o que é necessário ensinar nos dias de hoje para que meus alunos e minhas alunas tenham acesso ao mundo em que vivem de forma atuante e crítica? Estou ensinando o que é necessário? Estou ensinando da melhor forma? Será que todos/as os/as alunos/as aprendem da mesma forma, o mesmo conteúdo e ao mesmo tempo? Aqui já entramos nas questões que envolvem além de todas as diversidades explicitadas anteriormente, a diversidade de ritmos de aprendizagem.
Qual é o sentido da escola para suas alunas e seus alunos? Vocês já se perguntaram isso? Já perguntaram para eles/elas? E qual é o sentido da escola hoje? O que você faz, tem sentido para você? Porque estou perguntando isso agora? Porque para que desenvolvamos um olhar “para o/a outro/a”, precisamos lançar também um olhar para nós mesmos. Pensar sobre se faz sentido para nós o que fazemos, nos ajuda a buscar caminhos. Tem gente que vai para a escola como se fosse para um velório. Já sente que não há mais o que fazer. Então, que sentido tem isso? Que interesse pelo saber – uma pessoa que vai para a escola assim – consegue despertar em alguém?
Afora essa problemática subjetiva – gostem ou não – ela existe, os/as alunos/as estão aí: alfabetizados/as, não alfabetizados/as, negros/as, gays, pobres, com necessidades educativas especiais, superdotados, enfim...todos/as sabem: todos/as estão na escola.
Essa escola precisa fazer sentido. Para os/as alunos/as e para os/as professores/as. Como construir esse sentido? Digo com toda a certeza que esse sentido surge na construção de um Projeto Comum, um projeto que seja político e pedagógico. Um projeto que olhe lá na frente, mas que aconteça agora, com a humanidade presente, na construção do humano no sentido mais simples de sua concepção: a busca do ser mais. Um projeto que dê a todas e todos acesso à bens culturais, ao conhecimento construído pela humanidade e que vá além, que proporcione a construção de conhecimento.
Uma pessoa – pra lecionar – precisa decidir se ama o mundo o suficiente para querer trabalhar em algo que o tenha como meta. E precisa decidir se quer – realmente – um mundo mais justo, igualitário e diverso. Do contrário, sugiro que procure outro trabalho. Lidar com máquinas talvez seja melhor. A Educação Pública precisa de pessoas com a mente aberta para investir no humano. Pense nisso, reflita e decida. Se decidir por continuar, amanhã com certeza seu olhar será outro. E sua aula será outra...

Edna Telles

Fonte da imagem: http://flor-essencia.blogspot.com.br/2010/09/video-aula-1-as-revolucoes-educacionais.html (acesso em 01/10/2012)

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Terezinha Azerêdo Rios no Seminário de Educadores/as do Jaraguá

No dia 14 de setembro tivemos na região das escolas do Jaraguá, o Seminário de Educação, cujo tema central foi “MULTIPLAS LINGUAGENS COMO POTENCIALIZADORAS DO CURRICULO: A NECESSIDADE DE (RE)CRIAR A AÇÃO DOCENTE, OS TEMPOS E ESPAÇOS EDUCATIVOS”. O seminário contou com a palestra de Terezinha Azeredo Rios pela manhã e de Ana Maria Saul pela tarde. Nos dois períodos também ocorreram oficinas apresentadas pelas pessoas das escolas da região (entre CEIs, EMEIs e EMEFs) e colaboradores/as. Eu ministrei uma oficina junto com a POIE da escola onde sou coordenadora pedagógica, Marcella Fusatti, cujo título era: MÚLTIPLAS LINGUAGENS E NOVAS TECNOLOGIAS: UM NOVO PARADIGMA EDUCACIONAL COM USO DE LAPTOPS EM SALA DE AULA. Nessa oficina apresentamos o Projeto UCA (Um computador por aluno) e levamos os laptops educacionais para a realização da mesma.
Mas a contextualização aqui feita tem o objetivo de apresentar a seguir as minhas anotações da palestra da professora Terezinha Azerêdo Rios, que foi simplesmente maravilhosa e acredito que conhecimento só tem valor se a gente compartilha.

 

Mineira de Belo Horizonte, Terezinha Azerêdo Rios formou-se em Filosofia na UFMG. Fez o mestrado em Filosofia da Educação na PUC-SP e o doutorado em Educação na Faculdade de Educação da USP. É professora da PUC-SP. Faz parte do Conselho Editorial de Educação da Cortez Editora, pela qual publicou Ética e Competência e Compreender e ensinar – por uma docência da melhor qualidade, e, pela Editora Moderna, Filosofia na escola – o prazer da reflexão, em parceria com Marcos Lorieri. Trabalha também como assessora e consultora em projetos de formação de professores e educação continuada de profissionais de diversas áreas do conhecimento.

A professora Terezinha iniciou sua palestra, que era sobre os desafios da profissão docente, citando Paulo Freire: “A prática de pensar a prática é a melhor maneira de pensar certo”. E indagou: será que estamos sempre refletindo sobre o nosso trabalho? Pensar, nós pensamos sempre, mas nem sempre refletimos. E para completar o raciocínio, cita em seguida, o grande escritor José Saramago: “Se podes olhar. vê. Se podes ver, repara”. Reparar implica um olhar atento. Envolvidas/os no trabalho cotidiano, muitas vezes a gente não tem condições de reparar. É necessário “olhar para o nosso trabalho”, reparar atentamente. Um olhar crítico, um olhar com abrangência, é preciso ver com clareza, é preciso “desembaçar os óculos”, ver fundo, não se contentar com a superfície, com as aparências.
Diz em seguida que a realidade é contraditória, depende do jeito que a gente vê. Uma pessoa pode ser alta. Mas depende do ponto de comparação. Dependendo, pode ser baixa. Então, uma pessoa não é alta ou baixa, ela é alta e baixa. O curto pode ser comprido. Depende. É curto e comprido. Nesse sentido, o desafio seríssimo é colocar-se no lugar do outro. É levar em consideração o olhar que esse outro tem da realidade. A pergunta tem que ser pelo sentido, pelo significado, pelo valor.
É importante em nosso trabalho perguntarmos: O que fazer? Como fazer? Mas o mais importante é perguntar: para que? Essa é pergunta fundamental. O desafio da nossa profissão é ter a humildade e a coragem de assumir uma atitude crítica. Pois uma atitude crítica requer coragem porque é uma atitude perigosa. Nos mostra as vezes aquilo que não queremos ver. Nos aponta coisas que talvez precisemos modificar. Perguntemo-nos: meu ofício me agrada? Que ofício é esse? O que faz um/uma professor/a? O que tem que fazer um/uma professor/a? A gente quer ser um/uma bom/boa professor/a? O que faz um/uma bom/boa professor/a?
Ser professor é construir a humanidade. A Educação é a socialização da cultura. É a partilha do que a humanidade constrói. Ninguém nasce humano, torna-se humano. E vamos nos tornando humanos por um processo educativo, que no âmbito da escola é sistemático e organizado, onde se constrói e reconstrói cultura para a formação de seres humanos. A questão é: que humanidade eu quero construir? E então estabeleço currículo, organizo políticas. É a construção de si e dos outros para o exercício da cidadania. É construir liberdade com responsabilidade. O desafio guarda nele um gesto de desconfiança. E o que é que se coloca em dúvida em relação ao nosso ofício? Dar conta do nosso trabalho em todas as dimensões da competência: ética, política e estética. É um ofício complexo. Mas a competência não está pronta, ela vai se construindo. Ser competente hoje é diferente de ser competente ontem. Faz-se necessário indagar: é isso mesmo que eu preciso saber? É isso mesmo que eu preciso ensinar? E é importante lembrar que ninguém é competente sozinho. As condições não estão apenas em mim. Está no entorno, está no contexto. E termina sua palestra, citando João Cabral de Melo Neto: “um galo sozinho não tece uma manhã, ele precisará sempre de outros galos...”

domingo, 16 de setembro de 2012

Você conhece a Escola Nacional Florestan Fernandes?



Sábado, dia 15 de setembro foi um dia muito especial para a minha formação enquanto pessoa, para além da educadora, mas também para a educadora. Fui, juntamente com minhas colegas e meus colegas do Grupo de Estudos das escolas de Taipas, Jaraguá e Morro Grande, conhecer a Escola Nacional Florestan Fernandes, em Guararema, SP.

Para quem não conhece, a Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF) é um centro nacional de Formação do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), recebe militantes de todo o movimento, inclusive também de movimentos sociais de toda a América Latina. É carinhosamente apelidada de “Universidade dos Trabalhadores”.

Situada em Guararema (a 70 km de São Paulo) e inau­gurada em 23 de janeiro de 2005, a ENFF foi constru­ída entre os anos de 2000 e 2005, graças ao trabalho voluntário de pelo menos mil trabalhadores sem terra e simpatizantes. Sua missão é a de atender às neces­sidades da formação de militantes de movimentos so­ciais e organizações que lutam por um mundo mais justo.
Os recursos para a sua construção foram obtidos com a venda de fotos de Sebastião Salgado e do livro Terra (texto de José Saramago e música de Chico Buarque) e mediante a contribuição de entidades da classe traba­lhadora do Brasil, da América Latina e de várias partes do mundo.
Sua manutenção e funcionamento são assegurados por meio de financiamento de projetos nacionais e internacionais por organizações institucionais e priva­das, além da colaboração individual voluntária.

É uma escola que se “mistura” à vários outros movimentos sociais, movimentos rurais. Um exemplo pode ser  Movimento de mulheres.

A escola oferece um Núcleo de estudos latino-americanos (onde estuda-se, entre outras coisas, o que está sendo construído em termos de movimentos sociais na América Latina), há também um curso de especialização em estudos latino-americanos, um Núcleo de Teoria Política (que trata, entre outras coisas, da organização interna dos movimentos sociais, do pensamento de Marx, e preocupa-se com a formação de quadros do MST). Todos esses cursos são oferecidos apenas para pessoas ligadas ao MST e aos movimentos sociais. Mas, aos sábados, há os Círculos de Debates, que são abertos à comunidade em geral e que quiser, pode inscrever-se. Esses cursos acontecem graças à parcerias com cerca de 30 universidades públicas e outros núcleos formais. Há também a Associação dos amigos/parceiros da ENFF, onde José Saramago foi um dos colaboradores. Citaram também Chico Buarque de Holanda, professores/as de universidades, entre outros.

Todo o trabalho na ENFF é voluntário e baseado na auto-sustentação. Tudo o que é consumido é plantado ali mesmo. O espaço é bem grande e dispõe de alojamentos para estudantes que vêm de toda a América Latina, a capacidade é para 200 pessoas. Há o prédio onde ficam alojados/as os/as professores/as, lavanderia industrial, cozinha industrial, o espaço “Ciranda Saci-Pererê”, que é para as crianças (no intuito de incentivar as mulheres que são mães a fazer os cursos).

É um espaço de debates, de articulação, de formação sociológica, política e filosófica. A proposta de Educação nasce das práticas dos movimentos sociais e na constatação da falta de uma Educação efetiva para o campo. É impossível pensar nos movimentos no campo sem pensar nos processos de Educação. São os sujeitos do campo pensando os processos educacionais. Os cursos são baseados em uma Pedagogia socialista, pedagogia de Paulo Freire (pedagogia do oprimido), pedagogia do trabalho, cooperação agrícola e prática dos movimentos.

Problematizam as questões: o que é a escola rural hoje? O que é a educação no campo? E constatam que falta um sistema nacional de Educação que incorpore o campo. Discutem então, assuntos como desenvolvimento agrícola, Reforma Agrária, construção de uma educação do campo. É uma proposta que valoriza a cultura camponesa, os conteúdos são contextualizados no jogo do poder, porque compreende-se que no imaginário as sociedade há um preconceito com o homem e a mulher do campo, e isso se dá em meio à essas relações. Os objetivos do MST são a luta pela terra, a luta pela reforma agrária e contra as multinacionais e o agronegócio.

Discute-se também um projeto histórico de transformação social, de orientação socialista, discute-se um programa nacional de educação na reforma agrária, mas reconhecem que toda essa luta ainda é muito incipiente, mas a educação é a bandeira central do movimento. Há na Escola Nacional Florestan Fernandes o acesso ao conhecimento científico negado pelo sistema formal.

A escola conta com a ajuda de professores como Luiz Carlos de Freitas, István Mészáros, entre outros.


O ESPAÇO FÍSICO DA ENFF

A escola está erguida sobre um terreno de 120 mil m2, com instalações de alvenaria de tijolos fabricados pelos próprios trabalhadores. O projeto arquitetônico, oferecido voluntariamente, teve como princípio causar o menor dano ao meio ambiente.
Ao todo, são três salas de aula, que comportam juntas até 200 pessoas, um auditório, dois anfiteatros, uma biblioteca com 40 mil livros (obtidos por meio de doação), com espaço de leitura e ilha de edição. Além disso, a escola conta com quatro blocos de alojamento, refeitórios, lavanderia e casas destinadas aos assessores e às famílias de trabalhadores que residem na escola. Sua horta, pocilga e pomar produzem para consumo local. Para o lazer, oferece um campo de futebol gramado e uma quadra multiuso coberta.
O seu uso demanda a dedicação integral de 35 tra­balhadores residentes no local, de todas as áreas (admi­nistrativa, pedagógica, infraestrutura elétrica e sanitária e outros). Todos os que frequentam os cursos se encar­regam da limpeza, dos cuidados com a horta e outros trabalhos de manutenção.
A creche “Ciranda Infantil Saci Pererê” oferece um ambiente sadio e cuidadoso às crianças, enquanto seus responsáveis, principalmente as mães, estudam e/ou tra­balham.


O TRABALHO DE FORMAÇÃO DA ENFF

Nos cinco primeiros anos de sua existência, passa­ram pela escola 16 mil militantes dos movimentos so­ciais do campo e da cidade, de todos os Estados do Brasil e de outros países da América Latina e da África.
A escola tem o apoio de mais de 500 professores voluntários – do Brasil, da América Latina e de ou­tras regiões –, nas áreas de Filosofia Política, Teoria do Conhecimento, Sociologia Rural, Economia Política da Agricultura, História Social do Brasil, Conjuntura Inter­nacional, Administração e Gestão Social, Educação do Campo e Estudos Latino-americanos.
Além disso, oferece cursos superiores e de especiali­zação, em convênio com mais de 35 universidades (por exemplo, Direito e Comunicação no campo) e mestra­do sobre Questão Agrária, por meio de convênio com a UNESP e UNESCO.
A ENFF também mantém convênio com mais de 15 escolas de formação em outros países e com o Ministério da Educação de Cuba, com o objetivo de implementar no Brasil o método de educação e alfabeti­zação lá desenvolvido e praticado.

(parte do texto foi retirado do site www.amigosenff.org.br ) Entrem e colaborem!

Edna Telles







segunda-feira, 10 de setembro de 2012

O dia em que conheci Bernard Charlot

Quem é Bernard Charlot?



Bernard Jean Jacques Charlot nasceu em Paris, em 1944. Formou-se em Filosofia em 1967 e, dois anos depois, foi lecionar Ciências da Educação na Universidade de Túnis, na Tunísia. De volta à França, em 1973, trabalhou por 14 anos na Ecole Normale, um instituto de formação de docentes. No período de 1987 a 2003, atuou como professor catedrático da Universidade de Paris 8, onde fundou a equipe de pesquisa Escol (Educação, Socialização e Comunidades Locais), voltada para a elaboração dos elementos básicos da teoria da relação com o saber. Após se aposentar, veio para o Brasil. Como professor-visitante da Universidade Federal de Mato Grosso, seguiu fazendo pesquisas até ser convidado para ser visitante na Universidade Federal de Sergipe, em Aracaju. Desde 2006, é lá que coordena o grupo de pesquisas Educação e Contemporaneidade, engajado em delinear as relações com os saberes e explicitar de que forma os alunos se apropriam deles (http://filosofarpreciso.blogspot.com.br/2009/06/bernard-charlot-ensinar-com-significado.html), acesso em 10/09/2012.


No dia 01 de setembro (sábado) tive o prazer de conhecer pessoalmente Bernard Charlot. Fui a uma palestra dele no Instituto Singularidades, em São Paulo. Dentre tantas coisas que Charlot disse, compartilho aqui algumas das ideias que ele trouxe para discussão. Uma das coisas foi em relação ao sucesso das crianças das classes populares. Ele disse que essas crianças não necessariamente terão uma vida como a de seus pais. Disse que há uma posição social objetiva, mas há também o que as pessoas fazem em suas cabeças com essa posição social objetiva, porque existe também uma posição social subjetiva, e aí entra o papel da escola em mostrar possibilidades, caminhos, dar acesso à um outro mundo possível. Deu o exemplo de Luiz Inácio Lula da Silva (ex-presidente Lula), como uma pessoa que foi muito além de suas origens. Charlot deixou claro que sua abordagem é antropológica. Defende que o ser humano nasce incompleto, inacabado e que pela sua condição humana tem capacidade para criar o que precisa. O ser humano é humano, social e singular ao mesmo tempo. “Quanto mais social, mais sou eu mesmo, mais eu me desenvolvo enquanto singularidade”.

Diz ainda que só aprende quem se mobiliza intelectualmente. A mobilização é um movimento “de dentro”, ela supõe desejo (psicanaliticamente falando). Por isso Charlot justifica que não gosta da palavra “motivação”, pois é algo de fora pra dentro e, dentro da visão que ele acredita, motivação não funciona. O desejo pode investir em objetos de saber.

Na escola se aprende a não gostar do que se ensina na escola”. A professora tem que transformar crianças em alunos. Antigamente, a escola recebia alunos (pois toda a formação anterior era feita na família). Agora a escola recebe crianças, todo o trabalho que antigamente era feito no âmbito familiar, agora a escola precisa fazer. E completa que a escola democrática é aquela que faz o que a família não consegue fazer.

Na caracterização de alunos, relata que há alunos que aprendem com qualquer método (os considerados CDF´s). Há alunos que vão à escola para mudar a vida (em exemplo pode ser um bom aluno de meio popular)- que ele chama de voluntarismo. Há alunos aos quais a escola não oferece aventura intelectual (diz que as vezes até a professora acha chato o que ela ensina...). E há alunos que não vão à escola para aprender, vão à escola para passar de ano e se formar. Fazem as atividades apenas para passar de ano, mais nada. Nesse ponto, eu questionei o que fazemos então com alunos que frequentam escolas organizadas por ciclos, onde não há reprovação (a não ser ao fim do ciclo), o que fazer para que eles se sintam “mobilizados intelectualmente”? Charlot respondeu que esse é um problema, principalmente porque teoricamente as escolas são concebidas em ciclo, mas suas práticas continuam “seriadas”. Enquanto elas não funcionarem na lógica do ciclo e com práticas de ciclo, isso continuará sendo um problema.

Charlot ressalta que os alunos funcionam em uma lógica profundamente diferente da nossa. É preciso conhecê-los, saber o que pensam sobre as coisas, sobre a escola.

Entre outras coisas, Charlot comentou sobre algumas entrevistas que fez com crianças na periferia de Paris e também em periferias de algumas cidades no Brasil. Ele disse que a palavra “refletir” só aparecia relacionada à coisas fora da escola, sobre a vida, por exemplo. Nada na escola relacionava-se com o “refletir”. Isso é um problema. Na escola os alunos aprendem a obedecer. Existe uma “lógica da tarefa”. As crianças acham que estudar é fazer o que a professora disse que elas tem que fazer. Nesse sentido, a lógica do construtivismo nunca foi tão necessária na educação. E indaga: “mas como fazer isso amanhã na sala de aula”? A questão é: “o que é possível fazer”?

Todo mundo quer que os alunos pensem, mas ninguém os ensina a pensar”.

Charlot diz que, em relação as crianças de camadas populares que acabam por ser bem sucedidas inclusive na idade adulta, devem lidar ao mesmo tempo com o sucesso e com o sofrimento de se diferenciar dos seus familiares. É um sofrimento tanto da pessoa, quanto da família. Há uma tripla autorização: a de que o filho será diferentes dos pais, a de que você é diferente dos pais e aceitar que seus pais são diferentes (aceitá-los como eles são). É mais ou menos assim “ganha o mundo e perde a família” como referencial.

Pra finalizar, Charlot coloca a questão da sociedade contemporânea, suas contradições e desafios e que a escola precisa trabalhar com atividades que façam sentido e que sejam fontes de saber. Diz ainda que o conhecimento é sempre resposta à um questionamento. Tem que dar espaço para a criança falar. Temos que saber o que elas pensam sobre o que ensinamos.

Acredito eu que todos esses pontos “pincelados” por Charlot em sua fala nos levam a refletir sobre vários e diferentes aspectos da educação. O que ficou mais forte pra mim foi a questão da construção do sentido no saber e que esse sentido vem “de dentro” e não o contrário. Dessa forma, faz-se necessário repensar as práticas pedagógicas e tentar trazer os alunos para o centro da situação educacional, procurando ouvi-los, saber o que pensam e colocá-los em situações onde eles possam construir questionamentos e buscar respostas. Buscar algo que faça sentido.

E vocês, o que acham?

Edna Telles








sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Podem as tecnologias digitais contribuir para um melhor desenvolvimento da educação?


Um olhar crítico

(Texto de Maria Teresa Quiroz Velasco)
Alessandro Baricco empreende uma profunda análise da leitura, das novas linguagens e de um mundo bárbaro que nos assola e põe em risco a humanidade. Sustenta que hoje em dia a leitura está em crise e que quem compra livros não é, na realidade, leitor, mas personagens presos ao mercado. Observa que um número muito significativo de livros vendidos provém de filmes, novelas escritas por personagens da TV ou gente famosa, temas conhecidos ou auto-ajuda.

Baricco é muito crítico com a web porque consagra novos valores frente ao conhecimento e a informação. A qualidade tem sido redefinida, assim como a ideia do que é importante e o que não é. O significado mudou da seqüência do conhecimento, para seu movimento. Anteriormente, completa Baricco, a compreensão e o conhecimento estavam na profundidade dos assuntos, em sua sequencia. Agora se encontra em sua trajetória, que não está na profundidade e sim na superfície. “Navegar na rede. Nunca foram mais precisos os nomes. Superficie em vez de profundidade, viagem em vez de imersão, jogo em vez de sofrimento” (BARICCO, 2008: 111). Baricco assinala que se “surfa” na crista da onda, a qual o espetáculo predomina.

O autor alerta sobre a necessidade de se empreender uma política cultural que preserve a inteligência do azar do mercado puro e simples, porque a formação coletiva passa hoje em dia pela escola e pela televisão.

Podem as tecnologias digitais contribuir para um melhor desenvolvimento da educação?

A pergunta e sua resposta são fundamentais ao longo de todo esse texto no qual o esforço central está em materializar o uso de tecnologias digitais com fins educativos. Jesús Martín-Barbero y Germán Rey sustentam que hoje a maioria das pessoas não se incorporam à modernidade pelos livros e sim pelos gêneros e narrativas, linguagens e saberes da indústria, pela experiência audiovisual e pela internet. Se produzem profundas transformações no cotidiano, especialmente entre as novas gerações, que consomem a pluralidade de textos e escritos que circulam hoje. Também se constroem complexas relações entre a oralidade que perdura como experiência cultural primária da maioria e a visualidade tecnológica (JESÚS MARTÍN-BARBERO Y GERMAN REY, 1999).

Vivemos desconcertantes paradoxos na América Latina: por um lado somos testemunhas da abundância comunicativa, a ampla disponibilidade de informação e a explosão de imagens e de outro, uma deterioração da educação formal. Urge a necessidade de mudarmos de um modelo pedagógico pautado na transmissão de conhecimentos para um outro que se organize e se  fundamente na interatividade. Quais são as razões para essa mudança, de onde surgem e que exigências expressa? Se trata de caminhar de um modelo linear e centralizado para outro descentralizado e plural, coerente com as mudanças ocorridas na sociedade desde o fim do século XX, porém, em grande medida pelas exigências comunicacionais e cognitivas que nos sugerem os jovens. Manter o interesse e a atenção desses jovens é complexo e difícil. Trata-se de uma geração para a qual os modelos lineares e argumentativos tradicionais não fazem sentido. Os mais jovens se desenvolvem melhor que seus mestres numa variedade de conexões, relacionando a informação com a comunicação, sem separá-las, diferente do que os adultos fazem. Os mais jovens têm competencias para modificar conteúdos, para produzí-los e são espertos em compartilhá-los.

Por esses motivos, as decisões políticas no setor educacional e as políticas de gestão no interior das escolas são insuficientes porque não atendem ao sentido das mudanças relacionadas com a função de educar, limitando-se a investir em máquinas e tecnologias informáticas. O problema não pode reduzir-se a treinar professores para majenar computadores ou navegar na internet. Se trata de trabalhar e preparar os docentes para que compreendam o sentido da formação de seus estudantes como futuros cidadãos, como sujeitos autônomos com capacidades para discernir, argumentar e criar.

O brasileiro Marco Silva define o conceito de interatividade e manifesta:

“(...) a interatividade é um conceito da comunicação e não da informática. De fato, a interatividade é uma qualidade semiótica intrínseca das tecnologias informáticas, as quais permitem ao usuário operar com recursos de conexão e de navegação em um campo de referências multidirecionadas, permitindo entrar, manipular e modificar. O termo pode ser empregado para significar a comunicação entre interlocutores humanos e entre humanos e máquinas. Dado que o professor deve ser um comunicador, pode sintonizar a nova comunicação com a aula...” (p.16)

Nesse sentido, a educação interativa supõe, o que há muitos anos atrás Paulo Freire chamou de “educação dialógica”, não do professor para o aluno, mas do professor com o aluno. Como o nome indica, são relações de diálogo horizontais, em que o mestre deixa de “controlar” o conhecimento e acompanha os processos de exploração e reflexão. É claro que uma aula não será interativa porque tem equipamentos tecnológicos digitais, se nela permanecer a pedagogia da transmissão.

Texto base: VELASCO, Maria Teresa Quiroz. Tecnologias digitais: para a educação e a comunicação. In: CURY, Lucilene (org). Tecnologias digitais nas interfaces da comunicação/educação: desafios e perspectivas. 1 ed. – Curitiba, PR: CRV, 2012.

Referências:
BARICCO, A. Los bárbaros. Ensayo sobre la mutación. Barcelona: Anagrama. 2008.
FREIRE, Paulo. La importancia de leer y el proceso de liberación. México: siglo XXI.1984.
MARTÍN-BARBERO, Jesús y Germán Rey. Los ejercicios del ver. Hegemonía audiovisual y ficción televisiva. Barcelona, Gedisa. 1999.
SILVA, Marco. Educación interactiva. Enseñanza y aprendizaje presencial y online. Barcelona: Gedisa. 2005.

Fonte da imagem: http://tecnologianaliteratura.blogspot.com.br/ (acesso em 08/09/2012, às 01h21)

domingo, 2 de setembro de 2012

Nossos jovens em meio a imagens, sons e telas


(Maria Teresa Quiroz Velasco)
Nas plataformas digitais se multiplicam dia a dia as formas de inter-relação entre os jovens, e a educação e as aprendizagens não deveriam estar alheias a esses espaços.

Resulta substancial identificar os chamados “nativos digitais” e sua relação com os “imigrantes digitais” para compreender o mundo dos jovens e as fraturas geracionais que se expressam na família, na escola e na vida cotidiana.

Os nativos digitais passam muito tempo em contextos digitais, intercambiando correios eletrônicos, arquivos digitais e mensagens curtas de texto por celular, nos “chats” ou em redes sociais. Desde muito jovens começam a usar esses meios e estão habituados ao trabalho colaborativo através de intermediários digitais e não do papel e da impressão. Lêem menos, vêem mais TV e em geral consomem muitas imagens.

Nesse sentido, a escola e os sistemas de educação dificilmente podem competir com a televisão, e menos ainda com as redes, os jogos e os contextos participativos (PISCITELLI, 2008;2009). Estamos diante de um novo modelo porque o conhecimento da realidade dos mais jovens passa, em boa medida, por todos esses meios (IGARZA, 2008).

Não obstante, e apesar das oposições entre nativos e imigrantes digitais, as diferenças geracionais seguem atravessadas pelas distâncias sócio-econômicas e culturais. A desigualdade não pode entender-se nem reduzir-se à condições materiais e de recursos técnicos, mas a um acesso desigual a novos recursos de individuação, estreitamente vinculados aos conhecimentos facilitados pela digitalização. Pode haver muitas crianças ou adolescentes nativos digitais pela idade, mas que pela desigualdade educativa ou por pertencer a um universo familiar com muitas carências não adquirem as competências necessárias.

São iguais as crianças e adolescentes cujas famílias lhes estimulam a interpretação de imagens, o exercício da opinião e o desenvolvimento de múltiplas capacidades e aquelas crianças e adolescentes de origem familiar urbanas marginalizadas e rurais, onde a violência familiar é mais freqüente, o estímulo intelectual menor e a  educação dos pais mais escassa?

Definitivamente não é um assunto meramente tecnológico. Alberto Melucci sustenta que a informação é um recurso simbólico e reflexivo, porém não se trata de qualquer bem, porque para que a informação seja produzida e intercambiada se requer capacidades de simbolização e decodificação. Sustenta que “o conhecimento é cada vez menos conhecimento de conteúdos e cada vez mais capacidade de codificar e decodificar mensagens” (MELUCCI, 1999). Os conteúdos perderam o valor central que tinham na educação tradicional, por isso, hoje em dia, interessa menos “o que”, e sim o “como”.

Para os mais jovens, o essencial de sua relação com a tecnologia está na possibilidade de estabelecer vínculos ao longo de todo o dia. A tradicional separação entre pensar e sentir, a razão e a emoção, instauradas pela educação na família e consagradas pela escola, tem dado espaço a outras modalidades de relação. Essa ideia vai ao encontro do que Roberto Igarza diz quando sustenta que, para os mais jovens, “ser é, antes de tudo, comunicar”, porque desfrutam, em  seu tempo ócio “em baixar e escutar música em formatos digitais, organizar álbuns de fotos acessíveis através da Internet para que seus amigos possam ver e comentar, assistir vídeos curtos em sites como YouTube e chatear, ser parte das redes sociais, ao mesmo tempo em que fazem outras várias atividades simultaneamente. A televisão já não lhes interessa tanto (...) Necessitam de um elevado nível de (hiper)atividade, o que está muito bem contextualizado no modelo comunicativo da era digital” (IGARZA, 2008).

Carlos Scolari acrescenta que estamos frente a mudanças cognitivas nas novas gerações, as quais tem sido formadas em outras experiências midiáticas e perceptivas. A cognição de uma criança que passa o tempo em meio a telas interativas e narrativas transmidiáticas é diferente daquela que passa seu tempo em meio a TV ou com os livros. Nesse sentido, a escola é a que mais sofre porque se encontra, mais uma vez, frente a mudanças que não consegue conter e nem acompanhar as crianças e adolescentes.

Mas, sem dúvida, é equivocado pensar que os nativos digitais fazem um uso amplo e profundo da tecnologia.

Há autores que optam por examinar de forma crítica os chamados “nativos digitais”, como o inglês David Buckingham, que examina a visão complacente de muitos autores que falam sobre as possibilidades ilimitadas da tecnologia e sua apropriação por parte dos mais jovens: “...a realidade é mais complexa. A visão otimista dos jovens como uma “geração digital” livre e potencializada automaticamente em virtude de suas experiências com as novas tecnologias – não passa de ilusão. Essa concepção não leva em conta algumas continuidades fundamentais, assim como importantes diferenças e desigualdades, nas experiências culturais dos jovens (...) Há uma diferença significativa, cada dia mais profunda, entre a experiência da maior parte dos jovens com a tecnologia fora da escola e seu uso dentro da escola. E essa “nova exclusão digital” é a que a política e a prática educativa devem abordar agora com urgência” (BUCKINGHAM, 2008: 110).

Acrescenta Buckingham que muitas vezes se ocultam interesses de mercado ao apresentar-se as crianças e jovens como uma geração dotada de “fluidez tecnológica”. Os nativos digitais tem um estilo de aprendizagem pautado na interação e no maior valor à imagens do que a palavras, assim como ao valor à velocidade. Apesar de terem deixado para trás o modelo sequencial e o discurso de seus pais e professores, resulta equivocado “endeusar” as crianças e jovens pela sua capacidade de informar-se, inovar e criar conteúdos. Há muito poucos indícios de que usem a Internet para conectar-se com o mundo. A usam melhor para conectar-se a seus pares mais próximos e para estender as relações já existentes. (BUCKINGHAM, 2008: 110-124).
Texto base:
VELASCO, Maria Teresa Quiroz. Tecnologias digitais: para a educação e a comunicação. In: CURY, Lucilene (org). Tecnologias digitais nas interfaces da comunicação/educação: desafios e perspectivas. 1 ed. – Curitiba, PR: CRV, 2012.

Referências citadas no texto:

BUCKINGHAM, D. Más Allá de la tecnología. Aprendizaje infantil en la era de la cultura digital. Buenos Aires: Manantial, 2008.

IGARZA, R. Nuevos médios. Estratégias de convergência. Buenos Aires: La Crujía. 2008.

MELUCCI, A. Esfera pública y democracia en la era de la información. Metapolítica, no.9. 1999.

PISCITELLI, A. Nativos digitales. Revista contratexto 6: http;///.ulima.edu.pe/Revistas/contratexto. 2008.

PISCITELLI, A. Nativos digitales. Dieta cognitiva, inteligência colectiva y arquitecturas de la participación. Buenos Aires: Santillana. 2009.

Fonte da imagem:  http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=895 (acesso em 02/09/2012, as 20h16)

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Educação e desafios sociais


(Maria Teresa Quiroz Velasco)


Que mudanças ocorrem nos jovens, em suas formas de inter-relação e nos desafios que devem enfrentar, no contexto de mudanças tecnológicas?

Se as instituições já não proporcionam estabilidade, projetos em longo prazo, a pessoa tem que improvisar o curso de sua vida. Em meio a flexibilidade extrema do trabalho, os mais jovens tem que ser criativos e inovadores e desenvolver habilidades para a adaptação e a resposta a desafios muito distintos. Se nada está garantido, nem o local de trabalho, faz-se necessário um traço característico de personalidade que descarte as experiências vividas. Isso tem relação com o culto do “presente”, muito próprio da vida em idades mais jovens.

Para R. Sennett, essas características aparecem não somente na economia, mas também na cultura. Assim, as habilidades e sua duração no tempo vem mudando, o ciclo do conhecimento é muito mais curto, e a idade afeta diretamente a questão do talento e do reconhecimento social. Há novos valores que adquirem importância nas sociedades contemporâneas. São eles: a inovação, a qual afirma o caráter efêmero dos objetos e a variação dos processos frente a duração e a permanência que haviam dominado momentos sociais anteriores.

Há um conflito de valores porque enquanto os jovens abraçam o presente e as mudanças, os adultos subscrevem a permanência e a tradição. A velocidade e a aceleração mudam o valor do tempo e a visibilidade amplifica o sentido do olhar e, em termos culturais, outorga valor àquilo que os mais  jovens destinam suas energias: tornar-se visíveis os eventos, os objetos, os produtos e as pessoas, de todas as formas possíveis (Pérez Tornero, 1998: 266-267).

Martín Hopenhayn soma à essas reflexões o fato de que vivemos um paradoxo porque nunca se esperou tanto do sistema educativo como alavanca para o desenvolvimento e como forma fundamental para enfrentar os desafios do presente:

Se espera do sistema educativo que promova a igualdade e reduza as diferenças em termos de acesso a modernidade, a empregos produtivos, ao bem estar, que atue como mecanismo de igualdade de oportunidades. Se espera que transmita os conhecimentos necessários para o desenvolvimento de cidadãos da sociedade da informação que participem politicamente através dessas ferramentas. Se espera do sistema educativo que promova uma sociedade multicultural a partir da diversidade de pontos de vista e de perspectivas. Se esperam muitas coisas e obviamente o sistema educativo não está dando nada disso, ou está dando muito pouco (Hopenhayn, 2007).


Acrescenta ainda que se estende em nossos países um desinteresse pela escola e a perda de legitimidade da figura da autoridade. Surge uma tensão entre autonomia e disciplina, porque os jovens consomem cada vez mais informação desde pequenos, tem uma enorme facilidade com as novas linguagens de intercâmbio informativo, assim como valores mais flexíveis e expectativas por realizar suas próprias buscas. A cultura juvenil está profundamente marcada pelo consumo audiovisual, pela forma com que constroem suas referencias de identidade através da indústria cultural, particularmente pela música. A identidade juvenil está hoje em dia multiplicada em referenciais não duradouros, porém muito intensos, muitos expressivos e não necessariamente muito fáceis de entender de fora.

Referências:
VELASCO, Maria Teresa Quiroz. Tecnologias digitais: para a educação e a comunicação. In: CURY, Lucilene (org). Tecnologias digitais nas interfaces da comunicação/educação: desafios e perspectivas. 1 ed. – Curitiba, PR: CRV, 2012.

HOPENHAYN, M. Seminário de Análisis La cooperación cultura-comunicación en Iberoamérica. Madrid: OEI, 2007.

SENNETT, R. La cultura del nuevo capitalismo. Barcelona: Anagrama, 2006.


A partir das reflexões apresentadas no texto, proponho as seguintes questões:

  • Como as características do mundo contemporâneo, a dita “sociedade da informação” tem afetado o sistema educacional formal?
  • A escola tem condições de responder a todas essas expectativas? Porque?

Edna Telles

Fonte da imagem: http://tag032009.blogspot.com.br/2011/01/i-sociedade-da-informacao_27.html (acesso em 30/08/2012, às 23h44)