sexta-feira, 8 de março de 2013

Dia das mulheres

Não, não há nada mais que se possa fazer.
Aquela pequena menina já foi convencida pela sua criação
Que podia menos
Que sentia mais
Que brincava menos
Trabalhava mais
Brincava menos que as meninas brancas e ricas
Brincava menos que os meninos pobres como ela
Aprendeu devagarzinho ao ir à escola
Que sua fila era separada
E que ao ouvir dos colegas ao ver um menino em sua fila sem querer “credo, mulherzinha”, aprendeu bem que é vergonhoso ser menina, ser mulher.
Lá na casa dela, ao ver a mãe trabalhando muito e chegando em casa e continuando a trabalhar muito, fazendo comida, limpando a casa e lavando a roupa, verificando se todas as crianças comeram, vendo se havia lição de casa, acabada pelo cansaço enquanto seu pai descansava no sofá e de vez em quando gritava algo grosseiro, ela aprendeu a subserviência...
Quando seus professores não a convidavam a participar do grupo que desenvolvia projetos de tecnologia e a mexer com o equipamento da rádio e a ela pediam que escrevessem o programa, ela aprendeu que teria que ir para a área de humanas...
Quando seu namorado falou pra ela transar sem camisinha por amor, ela aprendeu desde mesmo antes disso, que deve ficar feliz em ter alguém que goste dela, ela assim tão sem futuro...
Quando engravidou aos 16 anos e foi deixada sozinha, pois afinal de contas, quem mandou não se cuidar? Ela aprendeu que não tem direito a decidir se quer ou não ter esse filho e que mulher pobre tem sim que querer, pois as ricas pagam aborto seguro...
Quando ela descobriu o amor com outra mulher, aprendeu que sua luta seria grande, pois para a sociedade em geral só há um jeito "certo" e "aceitável" de ter prazer: com o homem...
Quando ela estudou muito e foi procurar emprego, ela aprendeu que mulher que tem filho fica pra trás porque as empresas preferem as outras, que não faltarão por qualquer coisa, afinal de contas, ela fez o filho sozinha mesmo, não é?
Quando ela conseguiu um altíssimo cargo numa grande empresa, ela aprendeu que todo o seu trabalho, embora igual a de seus colegas homens, valia muito menos porque ela era mulher... e embora ganhasse muito dinheiro, era julgada porque não tinha tempo pra dedicação à família, aos filhos...afinal de contas, ela fez o filho sozinha mesmo, não é?
Quando ela entendeu todo o processo de exclusão sistemática e construída, ela mudou sua vida, deixou seus filhos brincarem com bonecas para aprender a cuidar de alguém e ajudar suas futuras companheiras. Ou companheiros? Começou a dividir as tarefas com todas as pessoas dentro de casa, independente do sexo sem medo de ofender ninguém, sem medo de se perder, sem medo de ficar sozinha.
Quando ficou sozinha por ter a rédea de sua vida, descobriu que existem outros homens (e porque não, outras mulheres?), que são legais e que a entendem e a vêem como gente.
E, feliz da vida, pensou que então, finalmente, poderia deixar que alguém cuidasse dela também. Mas desconfia que apesar das conquistas, ainda há muito pelo que lutar. Mas aprendeu também a não desistir, e hoje segue resisitindo.
Há sim, ainda há algo que se possa fazer.
E você, vai ficar aí parado?

Edna Telles