sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Como fazer uma intervenção na escola com o objetivo de desconstruir estereótipos de gênero?

Sou coordenadora pedagógica de uma escola municipal (de ensino fundamental) em São Paulo. Como eu estudo a questão das relações de gênero e, mais especificamente, das relações de gênero na escola, foi inevitável que trouxesse a discussão para a formação da equipe docente a qual trabalho. O primeiro passo foi discutir o conceito de gênero e como esses significados aparecem na escola. Lemos e discutimos alguns textos ao longo do tempo em que trabalho na escola (07 anos). Já demos alguns passos em relação à mudanças: não escrevemos nem falamos no masculino, são sempre alunas e alunos, professores e professoras, mães, pais e responsáveis... Procuramos sempre ter o cuidado de oferecer as mesmas oportunidades à meninas e meninos, intervindo quando isso não ocorre, por exemplo, colocando como obrigatório que a monitoria seja composta por meninas e meninos em número igual em cada classe, entre outras coisas. Mas em 2010 acredito que demos um passo além. Com a chegada das crianças de 06 anos na escola, começamos a estudar e discutir a importância do brincar e de trazer a cultura da infância como relevante para o planejamento de atividades diversas. Nessa discussão, o grupo decidiu comprar brinquedos para as crianças do ciclo I (primeiro ao quinto ano) e ficou decidido que pelo menos duas vezes por semana, cada classe iria brincar. Mas, juntamos o útil ao agradável e discutimos também a importância de desconstruir a dicotomia de gênero que aparece muito fortemente quando o assunto é brinquedo. Então, separamos caixas de bonecas e utensílios domésticos e caixas de carrinhos e bonecos, de modo que um dia da semana todas as crianças da classe deveriam brincar com as bonecas e no outro dia com os carrinhos. Foi um alvoroço. De crianças questionando, buscando explicações e aprendendo a brincar com os/as colegas e de professoras querendo aprender mais sobre relações de gênero para poder intervir.  No início, levamos o segundo ano, fizemos uma roda de conversa (no pátio externo) e expliquei que havíamos comprado brinquedos e que eles/as iriam brincar duas vezes por semana. Todos/as adoraram e ficaram ansiosos/as. Então eu disse que iria pegar as caixas... voltei com as caixas de bonecas e logo ouvi a questão: -“Edna, os meninos não vão brincar? Cadê os brinquedos dos meninos?. Respondi: - “vão sim, todos vão brincar com as bonecas!”... a partir daí, muitos outros questionamentos surgiram. Alguns brincaram logo de cara, outros precisaram de várias conversas até tentar... A experiência tem sido muito boa e tenho certeza de que todos/as estamos aprendendo muito: alunos e alunas, professoras e professores.  Logo, logo, contarei mais sobre essa experiência. Abaixo, segue algumas imagens.






 Espero que essa experiência sirva como uma forma de despertar o interesse pelo assunto e de fazer com que se perceba que não é tarefa tão difícil tentar quebrar paradigmas dominantes, mas que para isso, é preciso estudar, entender, dialogar. A formação de professoras e professores é primordial para que possamos transformar a dura realidade que é a desigualdade de gênero que vemos na sociedade (apesar dos avanços). E a escola é o local onde há espaço para o diálogo e para a contestação, sempre buscando uma sociedade melhor, mais justa e igualitária.

Abraços, Edna Telles.

12 comentários:

  1. Parabéns pelo belíssimo trabalho com gênero na escola! São iniciativas como essas que podem nos ajudar a tornar a sociedade mais justa. Beijos. Bete

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  2. Boas reflexões. Mas quero acrescentar a necessidade da promoção da igualdade com o respeito às diferenças de gênero, raça e classe.
    Edna, imagino que vc tenha tido o cuidado de solicitar autorização dos pais para publicizar fotos das crianças. Mas falo isso como alerta a todos(as) os(as) leitores(as) que queiram postar fotos de crianças. Parabéns, Rosangela Malachias. (www.midiaetnia.com.br)

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  3. Querida Edna,
    Que boas idéias! e... pra não ficar só num gênero, que bons princípios!
    Parabéns pela sua ousadia e pela experiência que ela gerou!
    Acho que ainda mais importante do que os brinquedos anti-discriminação, foi abrir oportunidade para as crianças de todo o primeiro ciclo brincarem na escola!
    Para Freinet, brincar é a forma mais séria e eficaz de aprender.
    Um abraço forte da Magui

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  4. Excelente trabalho Edna, a nossa escola deve cada vez mais promover ações como esta, afim de diminuir as diferenças de gênero, raça, esterotipo e classe social. São ações como estas que vão ajudar a promover a transformação em nossa sociedade.
    Abraços
    Flavia

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  5. Querida, Edna,

    mais uma vez, parabéns pelo trabalho!
    Estou sempre acompanhando suas ideias por aqui!
    Adoro e vejo este espaço como um fantástico para troca de experiências!

    Beijos

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  6. Obrigada Bete! A demanda é grande e sei que ainda há muito o que fazer. Mas trabalhar em prol de uma sociedade mais justa será prioridade sempre. Beijos

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  7. Oi Rosângela, tudo bem? Concordo com você: pensar a Educação que promova a igualdade requer sim pensar nas diferenças de gênero, raça e classe. Temos discutido muito a questão na escola e no grupo de estudos também (Edges/USP).Inclusive, para pensar os significados de gênero presentes na escola (ou fora dela) não dá para não considerar sua intersecção com outras categorias como raça e classe. Obrigada pela preocupação, todas as imagens expostas no blog têm autorização das pessoas responsáveis. Obrigada por participar da discussão. Espero que você possa contribuir também trazendo sua discussão que é riquíssima e muito relevante, sobre as relações raciais.
    Abraço, Edna.

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  8. Olá Magui, obrigada por sua participação. É verdade, a Escola de Ensino Fundamental ainda tem muito o que aprender a partir das idéias colocadas e discutidas na Educação infantil. Considero também um avanço, ver as crianças de primeiro ao quarto ano brincando na escola. Abraços, Edna.

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  9. Olá Flávia, tem razão, a escola deve mesmo promover ações que visem sempre a equidade, respeitando as diferenças e promovendo uma Educação Inclusiva. Afinal de contas, essa é função da escola, entre outras. Abraço.

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  10. Oi Carol! Agora sei que esse último "anônimo" é você! Obrigada por prestigiar esse espaço de troca de idéias. Espero que seja útil também nas discussões com as professoras dos cursos que você ministra! Beijos. Edna.

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  11. Oi Edna! Tive a oportunidade de concluir meu estágio pelo projeto Tof na escola que você coordena, e por incrível que pareça vivenciei momentos únicos que observei no cotidiano na sala de aula. Por exemplo, as brincadeiras no parque e com os brinquedos em sala. É gratificante esta ação entre as crianças na troca de experiência no ensino e aprendizagem que desenvolvem entre eles, isto implica uma soma na hora de alfabetizar. É importante meio de oportunidades para o educador se aproximar do aluno com mais sensibilidade, ou seja, conhecer o aluno e entender como trabalhar o material didático para cada criança.
    Foi algo inesquecível vivenciar tais experiências, espero poder compartilhar mais com seu blog, será uma satisfação...
    Beijos amore...Marta

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  12. Marta, querida! Foi um prazer tê-la na escola e perceber a construção desse olhar voltado para o universo da criança e sua educação com tanta consciência, por exemplo, da percepção da importância das brincadeiras no desenvolvimento das crianças. Beijos.

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